Quando me dano a ouvir rádio ou discos atuais me bate uma saudade danada de grande das vírgulas. Aquelas vírgulas gostosas que se enroscam em nossas pernas como um gato manhoso e nos acariciam como um cafuné cheio de outras intenções. Aquela mesma vírgula que Deus se inspirou para emoldurar a mulher e o homem se inspirou para encurvar o violão.
Hoje tudo virou exclamação de grandes efeitos e muita pressa. Cheios de metas e objetivos, a minha geração esqueceu da rede preguiçosa de Caymmi, que se deleitava em vírgulas e pausas infinitas sem qualquer compromisso senão com uma canção buliçosa soprando entre uma e outra onda do mar.
Ah Caymmi, como o mundo hoje necessita da tua preguiça.
Agora tudo é tempo tem hora e o trem passa. E as letras se encaixam nas melodias no acocho (porque apertando parece que dá). E as melodias se apertam numa frase no acocho (porque apertando parece que dá). E as músicas como se prontas ganham o mundo como uma criança sem entender veste qualquer coisa para não atrasar o horário dos pais. E eu, de coração apertado, sinto uma saudade danada de grande das vírgulas e da pausa que não teve.
Alguém me disse, em algum lugar que não lembro, que a hora é essa. Passei um bom tempo acreditando nisso e quando pequeno achava que não podia perder tempo. Quando maior achava que era o momento oportuno e tudo ou nada sairia dali. Maior ainda, entendi que agora sim chegava o instante crucial e eu tinha que correr. Até que uma poesia me sussurrou que era tudo balela. História tola como o bicho papão ou o monstro embaixo da cama. E que eu corria só para correr mais. E que seria sempre assim.
Aí, eu parei.
E me abracei com as vírgulas.
Ao presenciar uma obra com pausas é possível perceber se existem vírgulas nela. É possível sentir o cheiro da curva que a vírgula dá, e se arrepiar com o abraço que por vezes nos toma. Uma obra em plenitude pode nos virgular com maestria.
E dizem as más linguas, até, que quando um homem se virgula vira poeta.
Crédito da imagem: Juliana Lombardi
Na música, na vida… a arte precisa de pausa. Talvez precisamos cultivar um medo, O medo da pressa.
Sempre devagar, né Tiberio? Renato já dizia: temos todo tempo do mundo, pra que pressa?