Resenha: Tudo em um só
Artista: Bebel Gilberto
Lançamento: 29/09/09
Selo: Verve
Site oficial: www.bebelgilberto.com
Rockometro: 7,5
Carregar o fardo de ser filha de um dos maiores compositores e fundadores da bossa nova e de uma grande cantora não deve ser mole. Há muita pressão – vide Maria Rita e sua irritação ao ser comparada com a mãe, Elis Regina -, e acima de tudo, muita expectativa acerca do que virá. Bebel Gilberto parece não se importar. A carga genética, obviamente, acompanha-a em sua carreira, mas não apenas para abrir portas. Ela diz que, do pai, aprendeu tudo sobre música – acordava e dormia ao som de seu violão; e da mãe, aprendeu a cantar. O caminho? Ela fez o seu, à sua maneira.
João Gilberto lançou a filha aos palcos quando esta tinha apenas 14 anos. “Chega de Saudade” foi a canção escolhida e Bebel, no auge de sua puberdade, não fez feio. O primeiro EP veio 6 anos depois, em 1986. Ao se mudar para Nova Iorque no começo dos anos 90, a cantora se viu inserida numa cena bem diferente da brasileira. Influenciada pelo pop e pela urban music, e com parcerias consolidadas, lançou, em 2000 seu primeiro álbum de estúdio, Tanto Tempo. O mais aclamado de sua carreira, que contou com versões de “Samba da Benção”, “Mais Feliz” que compôs em parceria com Cazuza e Dé (“Preciso Dizer que Te Amo”, “Amigos de Bar” e “Mulher Sem Razão” foram as outras compostas pelo trio) , “Samba e Amor” do tio Chico Buarque, músicas próprias, além de uma versão em inglês para “Samba de Verão”. Logo depois vieram Bebel Gilberto, de 2004, e Momento, de 2007. Vale destacar sua participação no projeto Peeping Tom de Mike Patton (vocalista do Faith No More), cantando “Caipirinha”.
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All In One, quarto álbum de estúdio da cantora, mescla o jazz com batidas eletrônicas, e ritmos brasileiros. Bebel declarou, há pouco tempo, estar apaixonada e madura, e diz que o disco é “uma canção de amor na qual tudo acontece ao mesmo tempo”. Quem poderia definir melhor? “Canção de Amor” abre alas devagar, conquistando seu espaço aos poucos, e crescendo à medida que o primeiro refrão é cantado. Fica aquela vontade de deitar numa rede e deixar a vida passar, sem pressa. “Sun is Shining”, regravação de um reggae de Bob Marley, quase chega a soar séria. Suas batidas entram e mudam essa primeira impressão. Com Daniel Jobim (neto de Tom Jobim), surgiu a regravação de “Bim Bom”, que tem aquele “quê” de bossa nova e jazz – se ouvisse aleatoriamente, poderia apostar que era da turma das antigas. Uma de minhas preferidas, juntamente com “Nossa Senhora”, música mais “brasileira” do disco, e que leva uma das letras mais belas: ‘Nossa Senhora me deu a mão, me deu a luz, me deu um gás/ Nossa Senhora é demais’ (letras que tem a fé como temática me emocionam, e olhe que nem sou religiosa). “The Real Thing” é carregada de pop e jazz, e não é atoa que seja um dos hits. Ah, vale comentar que essa é de Stevie Wonder. Ao primeiro toque de “Ela (On My Way)”, imaginei a voz de Caetano – mas me vi transportada para uma cafeteria, surpreendida por uma lounge music carregada de sentimentalismo. “Far From The Sun” tem um belo piano, e antecede a música que leva o nome do álbum. “All In One” merece destaque, e define o que a própria Bebel disse do novo trabalho. Tudo acontece ao mesmo tempo. É o mix do cd inteiro, sem soar repetitiva ou cansativa. A próxima é “Forever”, quase introspectiva, com seu riacho e pássaros ao fundo. “Secret (Segredo)” chega ao pé do ouvido como uma confidência que precisa ser espalhada. Se você fechar os olhos, dá até para sentir a Bebel Gilberto por perto. Numa homenagem à eterna Carmen Miranda e seus 100 anos completados em 2009, “Chica Chica Boom Chic” é a mais animada, e assim como “Nossa Senhora”, é 99% brasileira. Para fechar, “Port Antonio”, e a certeza de que All In One pode não ser melhor que o debut Tanto Tempo, mas mostra uma Bebel mais centrada, mais certa de ter trilhado o caminho correto.
Tem músicas que nos machucam, agridem de alguma forma e nos deixam incomodados. All In One é a cura. Suas canções entram por nossos ouvidos e chegam até a alma, sussurradas pela voz suave e gentil de Bebel. Talvez soe cansativo. Talvez soe calmo demais. E importa? Para uma artista que correu o risco de estar sempre estacionada na sombra dos pais e conseguiu se desvencilhar disso, definitivamente não importa.