Do palanque ao palco
Dia 23 de Outubro, bairro Palermo, Avenida General Niceto Vega, oito da noite: tá no ar, e nos aires, o Porão do Rock.
O festival nasceu em Brasília já com banca e atitude política, e desde 2002 é uma ONG. Depois de doze edições realizadas em Brasília, iniciadas em 1998, o Porão do Rock sai pela primeira vez da capital política e do Rock nacional brasileiro e já decola em outra importante capital, a dos nossos hermanos (?) argentinos desafiando qualquer fronteira cultural ou idiomática.
O cenário do Porão não é lá tão underground, na verdade nem muito independente, o local do evento é uma balada alternativa das mais produzidas e caras da cidade porteña: Niceto (primeiro nome do General que lutou contra a conquista Brasileira na Guerra Cisplatina). Mas segundo Pablo – organizador e porta voz do evento – a idéia é que o próximo show porteño seja gratuito.
O festival tem dois lados e dois nomes: o primeiro atende pelo nome de Poráo do Rock, como graciosamente pronunciam os argentinos, é mais bem comportado e atento, tem cabelos cuidadosamente mal cortados, barba por fazer, usa couro, e seus Vans marcam os passos padronizados e clásicos na noite.
O segundo atende por Porão, e tem a atitude maiúscula da palavra, é a mistura brasileira do sul ao norte do país, tem trajes livres e com mais cores. São brasileiros a estudo, trabalho, ou de passagem por Buenos Aires a passos livres fazendo do rock e da noite uma experiência de rock-folclórico.
Bandas
Los Primitivos
As 20:34 da noite de sexta, o rock começa com os anfitriões, subindo ao palco os frenéticos Los Primitivos. O trio mandou muito bem quebrando o gelo e incendiando a noite. A platéia não precisou de aquecimento, entrou facilmente no ritmo rockabilly e alucinante dos caras. A banda tem toda uma performance e estilo de rock anos 50: cabelos engomados, topetes voluptuosos, camisetas brancas cavadas, calças e sapatos pretos, a noite parece voltar aos anos 50. Segundo Animal Lee, baterista da banda que toca de pé e com muita atitude, quando perguntando sobre o que pensava da iniciativa do intercâmbio musical, disse que crê que não há diferenças e barreiras políticas, e o que se deve ter em conta é a atitude do rock, com ela não há fronteiras de idiomas porque a linguagem da música é universal.
As 21.05 da noite é a vez dos The Tormentos. Aparentemente são mais bem comportados, depois se percebe que são mesmo é quadrados. Uniformizados com camisas pretas de golas vermelhas, recordam clubes antigos de futebol – palavra proibida aqui. O som também é padronizado. Leve hardcore misturado com um retrô Surf Music. E para confirmar a aparência, ao final de todo som que fazem soltam um grito de torcida com o nome da banda: The Tormentos! Sim, um tormento. Por fim, as 21.40 terminam perguntando a galera se fariam outro tema ou não. A platéia, politicamente correta – respondeu timidamente que sim. E assim são mais alguns minutos de tortura.
Autoramas
21.53. Autoramas corre para o palco e já inicia num ritmo alucinante. Mandam um discurso bem simples e também político em espanhol dizendo que são do Rio e agradecem ao público porteño. Da terra da Bossa Nova e do Funk é fácil imaginar o que se deve ter passado nas cabeças porteñas sobre o que viria a seguir. Mas a galera mostrou que estão na praia desde 1997 é para fazer rock, e como mesmo dizem, fazem rock para dançar. O trio é um caldeirão com rock anos 60, New Wave dos 80, tem cara de Jovem Guarda e atitude Punk-Rock. A banda já é uma das principais do circuito alternativo e independente brasileiro, tem rodado boa parte do mundo e balançou facilmente os argentinos ao som de “Você Sabe” e “Nada a ver”.
22.46 – Apesar do nome que gera uma sensação de rebeldia, o El Mató a un Policía Motorizado sobe ao palco às 22.53 de forma bem comportada. Quando perguntados sobre a origem do nome, dizem que certo dia estavam numa esquina qualquer de La Plata e um policial os abordou pensando que eram uma facção semi-terrorista – exagero – mas o que o patrulheiro não sabia é que segundo eles estavam e são cheios de amor para dar. Os quatro pibes, garotos de La Plata, são uma banda de Indie-Rock com músicas melódicas e fáceis de ouvir, mas para isso o som é extremamente bem trabalhado. Ao som de “El día de Huracan” colocam o público numa viagem super transcendental, e depois com “Navidad En Los Santos” alternam os momentos melódicos a outros velozes que desorientam e envolvem completamente o público que arrisca as primeiras rodas de mosh da noite. Se despedem às 23:25 e são ovacionados, gesto compreendido nas duas línguas.
23.46 – Mundo Livre S/A entra para fechar a noite com muita originalidade e trajados de caráter circense. A banca de Pernambuco da geração Manguebeat são bem teatrais e sabem fazer festa. Manda já de cara o Samba-Rock “Bolo de Ameixa” e deixa os brazucas embriagados – claro que a Quilmes no fim de noite também deu uma mãozinha – enquanto os porteños ainda tentavam entender com muita atenção o que estava rolando. E para manter o clima de curiosidade, fantasia, e despertar ainda mais o interesse argentino para o ritmo do Mangue, tocaram o “Mistério do Samba”:’ o samba não é carioca, o samba não é baiano, o samba não é africano, não é canarinho, não é verde e rosa, não é bossa-nova, o samba não é carnaval (…) então, afinal, o que é o samba?’ Fred Zero disse que é tudo. Inclusive Rock. Fecharam a noite introduzindo uma roda de ciranda com o público. E o primeiro dia terminou assim, com todos os tipos dessa linguagem universal que é o Rock. E tem gente que ainda acha que ele morreu, na verdade só trocou de roupa e agora anda cantando também mais do que nunca em português e castellano.
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