O outro caminho que o rock carioca está tomando vem da base formada pelos três datas de Festival Fora do Eixo no Rio, e essa brincadeira de guitarras chegou ao seu terceiro e último dia no antro Rock n’ Roll e emblemático desse estado, o Circo Voador. O Rio de Janeiro ainda tem muito rock para mostrar.
Camarônes Orquestra Guitarrística
Infelizmente, essas linhas não chegaram a tempo de dar seu pitaco na apresentação do Stereologica. A banda seguinte é fruto da crescente cena instrumental que vem tomando os palcos nesse país, e tem rostos jovens e atitude pop ‘n roll. A mistura de acordes simples, porém precisos, que o Camarônes Orquestra Guitarrística, são calcadas em várias vertentes do bom e velho rock, mas com doses fortes de surfmusic e dedos no peso americano televisivo dos anos 90 .
O show empolga, surpreende, esquenta um público que está ali para ver outros grupos que pisam mais fundo nos pedais de distorção das guitarras, mas como toda jovem banda iniciante na estrada indie, peca em certos pontos bobos, como a fraca presença de palco dos guitarristas Leo Martinez e Karina Monteiro, e ainda alguns erros de execução do baterista Xandi Rocha – que chegou a usar uma maceta (tipo de baqueta) gigante, de colocar qualquer Massacration no chinelo. Destaque para as linhas poderosas e seguras propostas pelo baixo de Ana Morena (atualmente ruiva) e a inquietude de Anderson Foca atrás de seu laptop. Foca, aliás, em certos momentos irrita, tamanha sua preocupação em chamar a atenção, mesmo estando no fundo do palco. Exemplifico com a execução de “Pororoca”, onde imitava um laser com sons de seu laptop e, apontando diretamente para o público na frente do palco, ‘me matou’ algumas vezes. A faixa “Drunk Driver” imprime bem a apresentação: nervosa e surpreendente, mas louca e com necessidade de amadurecimento.
A cena do Macapá está em polvorosa tamanho o crescimento e dimensão que seus frutos estão ganhando no Brasil. O maior petardo do estado é hoje o som que seus pais ouviram há quarenta anos atrás. O Mini Box Lunar busca as raízes psicodélicas que um dia habitaram os ouvidos do mundo pedindo paz e amor, e hoje só é lembrado aqui no Brasil pela possibilidade de acontecer o Woodstock. Além da era hippie, também tem seu toque Balão Mágico e algum ponto regionalista, fazendo uma maçaroca sonora desaparecida há décadas em nosso país.
Sady Pimenta no baixo e Alexandre Avelar na guitarra mostraram toda a segurança de músicos experientes, mas o teclado e efeitos de Otto Ramos e a bateria de Pepeu Ramos acabaram sofrendo com problemas técnicos, como falta de retorno e um bumbo de bateria ambulante, respectivamente. Quanto a Heluana Quintas e Jenifer “JJ”, as beldades atrás dos microfones, só faltaram uma coisa: cantar. Sem potência de voz e o mínimo de preparo, a dupla vocal simplesmente nada acrescentou – para não dizer que ficaram devendo. Com isso, o psicodelismo da apresentação acabou tomando voos altos demais e tudo foi ficando lisérgico e perturbador, contrastando com a felicidade proposta. Talvez o grupo estaria melhor acompanhado se tocasse com o Porcas Borboletas no dia anterior, em advento ao Nevilton e a garrafa de cerveja, que estariam melhor posicionados na noite do Circo Voador.
Com ar de superprodução e atração principal, o trio Macaco Bong só era a antepenúltima banda da noite e a que mais público arrastou para baixo da lona verde e branca do Circo. A fervorosa virtuose provinda dos riffs e solos envenenados da guitarra de Bruno Kayapy nos mostraram um momento único de beleza técnica, qualidade sonora e energia vinda daquele palco. Hipnotizado, o público chegava a arriscar cantarolar os riffs, mas a velocidade na qual eles são executados é tão impressionante, que só nos resta olhar e balançar a cabeça para cima e para baixo, como bons headbagers.
O único interlocutor entre banda e público, o baixista Ney Hugo parece um cara simples e comportado, perto das caretas monstruosas de Kayapy e a pegada extremamente pesada do baterista Ynaiã Benthroldo. Ynaiã fazia os pratos balançarem de tal forma, que o som do chimbal e do ataque se confundem, dando uma uniformidade ao som da banda sem deixar de variar, como foi em “Shift”. O Macaco Bong tem estatus e moral, entrando no palco com luzes apagadas e saindo jogando guitarras e partes da bateria para o alto, ao som de “Mais Um” do público – atendido, claro. A banda recentemente gravou um álbum ao vivo, ainda a ser lançado, e apresentou no Rio uma única música inédita. Catártica apresentação a ser revida inúmeras vezes.
A pedidos da produção da banda, o Canastra deixou de ser a última banda da noite para mostrar seu som anos 50/60 no meio das guitarras pesadas da noite. O grupo, que já tocou no Circo Voador inúmeras vezes, já é considerado ‘de casa’ e trouxe seus fervorosos fãs mais uma vez para, na esperança, conhecerem algumas faixas da nova e tão esperada bolacha de inéditas – que tem previsão de saída ainda esse ano. Fernando Oliveira, o trompetista e guitarrista, já havia deixado sua marca no festival na noite passada, junto ao Brasov e Nevilton, e o ex-baterista da banda, Marcelo Callado, também tocou com o Do Amor no dia anterior, colocando uma certa supremacia à banda – mas só coincidências.
Pois é, infelizmente, uma única faixa inédita esteve no meio das costumeiras e ótimas versões de improváveis canções, particularmente modeladas de maneira para a execução da banda. O repertório foi calcado no elogiado álbum Chega de Falsas Promessas e a força que o grupo exibe no palco só é rebatida pela resposta imediata do público – que está eternamente in love com a banda. Depois de longos anos de sofrimentos, o Circo Voador voltou a exibir uma qualidade de som respeitável e isso também ajudou o Canastra e seus seis músicos (três metais) a agradar até quem estava ali pelo Macaco Bong. Destaque para a movimentação de palco e grandes músicas como “Miss Simpatia”.
Com o advento da troca de horários, a estréia do Black Drawing Chalks no Circo Voador se tornou mais épica – e também mais dramática. Um dos grandes nomes do independente no Brasil atualmente não veio pela primeira vez a essas terras, mas sim com mais respeito e acima de tudo humildade. Nem mesmo prêmios importantíssimos pela revista Rolling Stone os impediram de insistir no velho jabá e oferecer camisas e cds (por três longas vezes) , além pedir desculpas por uma corda arrebentada, o que culminou em menos uma música no set e uma jam session entre Renato (guitarra), Dênis (baixo) e Douglas (bateira), que poderia muito bem se chamar “Improviso em Ré”, por conta da única nota que a jam tinha.
O grupo, apesar da ainda recente exposição, fez um show de banda grande e vivida, mesclando faixas de seu primeiro álbum, Big Deal, mais três músicas inéditas (a pesada “Red Love”, a quase pop “Simmer Down”, e mais uma quase inédita nos palcos), além dos petardos de um dos álbuns brasileiros clássicos dos anos 2000, Life is a Big Holliday For Us – nome que imprime bem a posição dos músicos em cima do palco: uma grande diversão. Para causar um frisson a mais, Chuck Hipólitho, o grande músico que divide com o BDC o projeto Love Bazukas, estava no Rio na fatídica data e até uma participação chegou a ser data como certa, mas o quinto aniversário de casamento do ex-Forgotten Boys e atual Vespas Mandarinas, impossibilitou a presença, tendo de deixar para a próxima essa participação. Intensos gritos e palmas, trouxeram a banda mais uma vez ao palco, tocando a tão pedida “Suicide Girl” e mais uma para o delirante grupo que não arredou o pé do Circo até o final das apresentações.
Mais uma memorável noite onde uma nova linha na história da cena independente carioca vai sendo escrita. Sabemos que cada um ali deu seu sangue, noites de sono e o que não tinha para fazer a noite ser a melhor, que a voz do rock voltasse a ecoar, e o resultado foram os mais honestos e sinceros momentos de orgulho por estar vendo essa cena crescer novamente.
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[…] deram sua opinião. Aproveitando o encontro que tive com dois integrantes da banda no Festival Fora do Eixo, trago com exclusividade informações sobre essas duas fatídicas […]
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