Resenha: Crystal Castles @ Circo Voador, Lapa-RJ 25/09/2010
Recobrando o fôlego ainda, parece que estive em outro universo e regressei. Compreendi então que Crystal Castles no Circo Voador não foi apenas um show, porém uma experiência. Não uma experiência de espetáculo, fogos ou chuva de papel picado, mas sim uma experiência de transe coletivo. Transe que começa a partir do momento em que Alice adentra o palco com sua garrafa de bebida na mão, encarando o público com seus olhos zumbis, e ali já faz o prenuncio… Hoje será vosso batismo!
Tivemos uma boa preparação com o duo Digitaria com imagens em um telão que, diga-se de passagem, muito bem bolados. Os vídeos eram uma atração à parte, um mix de pornochanchada com spank, terror, imprimindo um estilo bem freak nas sequências, ao som de um eletrônico que ia animando os ouvintes. A dupla foi substituída pelos Djs Yugo e Andre Camar que se incumbiram de fazer a pequena transição que abriu espaço a grande presença aguardada nesses 4 anos de festas Shout! & Electroshake: o Crystal Castles.
Ethan entrou tímido e foi para sua picape, na sequência entrou o baterista, e eis que o clima do lugar muda completamente quando aquela personagem adentra o espaço com uma garrafa do julguei eu ser Uísque, com olhos muitos famintos encarando a platéia, como uma pedinte de rua envolvida pelo seu casaco maior que seu corpo, com um andar completamente desleixado e perdido, parecendo que iria desmaiar até começar a soltar os primeiros versos de “Fainting Spells”.
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“Fainting Spells”
Alice diz que fará você esquecer, e você deve acreditar. Após a frenética sequência de “Fainting Spells”, a dupla logo chama um dos momentos mais aguardados do público… É hora do Batismo. Ao som de “Baptism” a cantora começa suas performances e começa a batizar o público com seu intenso e nada elegante 8-bit. A animação do público no Circo Voador era contagiante, tal quais moléculas se chocando dentro de um recipiente, o espaço era pequeno demais para caber o transe de todos mais o de Alice.
Aqui reservo um parágrafo que devo dedicar completamente à cantora. Alice parecia não se conter dentro de seu corpo. Uma força maior que a fazia se contorcer com todas as suas forças, e toda essa energia era direcionada ao público, a quem dedicou três “moshs” durante o show. Ela se misturava ao público até não aguentar mais e ser puxada e repuxada e implorar por ajuda. Alice era a energia em pessoa após fazer desenhos profissionais no ar com seu fumo, a cantora se direcionava também a bateria, na qual subia em cima e fazia altas performances, enfim, ela não se continha… Nem um pouco.
Estranho pensar que mesmo sem entender nenhuma palavra que saída do sofrido microfone da nossa cantora – talvez em decorrência do som muito alto ou do excesso de efeito – entendiamos o que cada música nos pedia para fazer, seja pular como loucos ou simplesmente olhar hipnotizados. A aura triste e sofrida, junto com um talvez processo de depreciação própria, fica mais evidente pelo fato da cantora só se comunicar com Ethan engatinhando até ele, ou sua briga intensa para acender um cigarro e pedidos de ‘fuck me, fuck me, please’ em alguns de seus moshs no ardente público.
Nesse clima intenso foi que ótima “Courtship Dating” tocou meio perdida na primeira parte do show misturada às músicas do novo CD, e em seguida o ótimo B-side “Insectica” destruiu nossos ouvidos. Como se não fosse intensidade o bastante a dupla resolveu lançar na sequência a mais que frenética “Doe Deer”, cujos versos frenéticos de morte faziam o público se chutar e se socar a ponto de não sobrar mais espaço entre as pessoas, que estavam a ponto de se perderem.
Então Alice nos mostra a salvação. Num momento onde não tinha como energizar mais a platéia, a “leader band” começa a convidar o público a segui-la para lugar nenhum. “Celestica” entra no show como água para as nossas almas, como a luz no fim do túnel, como a satisfação de termos chegado até ali. Pois é, mais a música que tem o poder de ser o auge do show, também pode dividi-lo ao meio. E é isso que “Celestica” faz, dá uma desacelerada no público e é seguida por “Empathy” que fecha a setlist de músicas do primeiro álbum da dupla.
A segunda parte levou “Reckless” e “Crimewave” à um publico já não mais tão frenético, à ponto de Ethan pedir que as pessoas se animem. “Air War” veio em seguida e fez as pessoas dançarem, mais sem aquele gás das músicas mais agitadas da banda. Mas Alice estava lá novamente para dar um jeito nisso. A musa começou a ensinar sua prática ao público, ela atacou tudo que viu pela frente em “Alice Pratice”, subindo na bateria socando os microfones de um lado pro outro, atirando-os contra os pratos, hora em que todos pararam boquiabertos com as peripécias da moça.
“Black Panther” foi cantada pela moça desfalecida, se jogando no público (que delirava) e distribuindo bebida “free” para todos (direto da garrafa da Alice!), mas como tudo que é bom não dura para sempre o “break” foi chamado por todo o ritmo de “Untrust Us” e um adeus sem graça da dupla. Alice e Ethan voltaram trazendo a ótima “Intimate” do novo álbum da banda sob muitos gritos da platéia, e então para fechar com chave de ouro o Crystal Castles lança “Yes No” com o contagiante refrão “Yes, No, Maybe So” e assim, no ritmo que dominou a noite toda, a dupla se despediu dos cariocas que ficaram com a certeza de que nem tão cedo presenciarão outra experiência daquele tipo.
Agradecemos ao André pelas fotos
e ao Raoni e Loulou pela confiança