Resenha: 53HC @ Belo Horizonte 16/10 – Primeiro dia
Festival de música é…
…um ambiente não recomendado aos britânicos – a não ser que seja um festival de música britânico, evidentemente.
Quem acreditou no conto do vigário e chegou pontualmente às 20h ao Lapa Multishow para comemorar a primeira década de vida do 53 HC Fest novamente perdeu seu tempo. A banda mineira In Verso, primeira atração da noite, só deu as caras por volta das 22 horas. Mas como o conto do vigário já é velhíssimo – tão ou mais quanto o desinteresse do público em conhecer novos trabalhos, mesmo em um festival de música independente -, o grupo teve que tocar para uma casa praticamente vazia.
No teste de paternidade musical do In Verso consta o seu puro sangue mineiro: a vocação para o power pop e o timbre vocal vem do pai Ímpar; já da mãe Monno, como não poderia deixar de ser, a banda herdou o ‘sentimentalismo’ excessivo das interpretações e letras. “Meu Tempo”, última canção do set, além de arrancar alguns aplausos da platéia, mostrou que o grupo funciona melhor quando resolve deixar o chororô de lado e investe mais em seus culhões.
Em seguida mamãe, quer dizer, Monno, entrou em cena. Pela pompa de atração principal, com direito a apresentação do currículo da banda e tudo – shows ‘antológicos’ como a participação no Pop Rock Brasil, abertura para o Skank na turnê Carrossel e presença em um festival no Mato Grosso –, o Monno parecia já ter a platéia ganha antes mesmo da partida começar.
Apesar de não estar tão elegante quanto no festival Outro Rock (quando trajava uma bermuda jeans e um cachecol no pescoço), o carismático vocalista Bruno Miari mostrou porque é o Thom Yorke brasileiro. O resultado? Escárnio. Um dos espectadores começou a imitar os espasmos do vocalista. No mais, palmas escassas e o anúncio de que o Monno abrirá para o Faith No More em Belo Horizonte. O aviso foi dado. (Alguém falou em música?)
…um punhado de bandas que ninguém quer escutar e que servem apenas de coadjuvantes para a atração principal da noite.
Pois não é que dessa vez o protocolo foi quebrado? Ou a atração principal não seria exatamente tão principal assim? Dúvidas à parte, os momentos mais animados deste primeiro dia do 53 HC Fest foram protagonizados justamente pelos ditos coadjuvantes.
A banda mineira The Folsoms transformou a pista do Lapa em um verdadeiro saloon e conseguiu com seu country rock a grande proeza de fazer todo mundo dançar. Sim, todo mundo, inclusive a turminha da rebarba que faz questão de ficar bem longe da multidão! Teve até direito a palminhas da galera e um dueto “Johhny and June” ao final da apresentação – pena que a voz da June não colaborou, o que não comprometeu em nada a apresentação.
A quadrilha, como bem chamou o vocalista do The Folsoms, continuou com a os paranaenses do Hillbilly Rawhide. Na primeira metade do show, a presença de solinhos de violino serviu para enfatizar ainda mais o climinha velho oeste que já havia tomado conta do local. Na metade derradeira a chapa esquentou, a banda mostrou seu lado mais hardcore e se transformou numa espécie Matanza assumidamente country – a entonação do vocalista servia para acentuar ainda mais a semelhança.
O Motorama, atração internacional da noite, pisou logo em seguida e além de um cenário improvisado ao fundo (me) trouxe outra surpresa: um dos seus integrantes que parecia ser o baixista da banda carioca Canastra era, na verdade, o vocalista do grupo argentino. Se o contrabaixo acústico e o visual dos membros do conjunto eram bastante suspeitos, bastaram os primeiros acordes para ter a certeza indubitável de que o Motorama é o ‘hermano’ siamês do Canastra. E, por sorte, tão competente quanto. Para além da cordialidade gringa – “estamos unidos aqui pela comida e pela mulherada mineira, de quem nos falaram muito bem” – e das macaquices do vocalista, o delicioso rockabilly do conjunto fez até este escriba se render ao encanto da apresentação e cair na fanfarra. Mas grande surpresa da apresentação foi a versão agitada que o Motorama preparou para “No Surprises”, do conjunto britânico Radiohead.
…é, acima de tudo, um lugar onde nem sempre a música acaba sendo o fator principal. Ou não.
“Começa logo, começa logo!!!”; “Cachorro, Cachorro!!!”. Durante a única demora entre os shows, tirando a fã ardorosa e uniformizada em questão não houve nenhum outra sinal de entusiasmo da platéia em querer presenciar a dita atração principal da primeira noite do 53 HC Music Fest. Pelo contrário: boa parte do público que havia se divertido ao som da quadrilha já havia deixado o Lapa Multishow antes mesmo do final do show do Motorama. Teriam resistido, então, apenas os verdadeiros fãs do Cachorro Grande? Não exatamente: os que não saíram durante a apresentação, na grande maioria das vezes estavam alheios à própria música que ali estava sendo executada.
O show começou com o hit “Você Não Sabe o que Perdeu” e pela resposta eufórica dos presentes, tudo levava a crer que realmente as próximas horas seriam muito boas e que os dois anos de ausência tinham realmente feito falta aos belo-horizontinos. Mas, como bem diz o ditado popular “cão que ladra, não morde” – o que costuma ser ainda mais verdadeiro quando o cachorro é grande. Se aos poucos o frio começou a tomar conta da pista, o humor tipicamente gaúcho marcou o ponto de fusão do show: “o nome do nosso novo disco se chama buceta, quer dizer, cinema”. Ha ha. “Amanhã” e “A Hora do Brasil”, músicas inéditas, não empolgaram.
Beto Bruno, vendo o encanto se perder, tentou de tudo: desde maneirismos hippongas (“a gente quer tocar para essa galera maluca que gosta de Rock’n’Roll”) até bronca no guitarrista (“a gente ta aqui no maior tesão para tocar para vocês, mas desde o começo esse guitarrista bundão está com cara de cu”). Nada adiantou, ainda mais com as cansativas jam sessions que contribuíam para matar o resto de ânimo das viv’almas do recinto. Conclusão: “Sinceramente” e “Lunático”, e conclusão. Sem bis.
…um preço salgado para bebidas e comidas – mesmo as mais picantes e gordurosas – que deveriam nos deixar mais doces.