Grito Rock RJ e Niterói @ Circo Voador e Box 35, Rio de Janeiro 24 e 25/03/2011

Texto por Marcos Xi
Fotos por Juliana Ribeiro
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The Fraktal (foto por Maykon Sousa)

Lembro que uma conhecida banda carioca me disse esses dias que no Rio não existia uma cena, que as bandas não se ajudam e que o rock aqui anda agonizando. Não foi o que eu vi nas edições carioca e niteroiense do Grito Rock neste último final de semana. A Ponte Plural, responsável pelos dois eventos, deu o máximo de conforto e garantias as bandas, mas não fez nada acontecer sozinha e precisou da união dos participantes para que seus eventos ocorressem. E não foi pouca ajuda.

Se você é aquele cara que só vai nos shows de amigos, de artistas que aparecem na MTV ou hypados e acha que ali está a nata do som, está na hora de desentocar e parar para reparar no que é feito a sua volta. O Rio de Janeiro não está na sua melhor fase, mas também não está de joelhos esperando o seu fim. Uma nova geração de bandas vem tomando o caminho daqueles que estão desacreditados e cruzaram os braços para a atitude. Na sexta-feira, 25 de março de 2011, dia que deveria ocorrer o Grito Rock Niterói, a produção viu o local de seu show ser fechado, mesmo com todas as matérias, divulgação e bandas pagas além da autorização para o acontecimento do evento.

Para você se situar no ocorrido, o evento ocorreria no bloco E do campus Gragoatá da UFF com prévia autorização do Prefeito do campus. Mas uma liminar na véspera do evento tirou a possibilidade de acontecimento do Grito Rock no local. Às 13 horas d dia marcado, seria o horário das primeiras bandas chegarem para a passagem de som, mas o que ocorreu foi uma mobilização para que o evento acontecesse. Após uma peregrinação das bandas e dos produtores por casas que poderíam servir de nova residência  para o evento, finalmente foi encontrada uma disponível e na altura que as bandas mereciam. O Box 35 é bonito e bem a cara do rock, além de ser localizado apenas a alguns metros do local onde iria ocorrer o evento originalmente. A negociação foi a mais branda o possível: a produção compraria todas as bebidas e uma porcentagem iria para a casa – fora isso ainda tinha o pagamento dos funcionários. A possibilidade de um prejuízo quando não se esperava pagar a casa (que seria no tal campus) era forte, mas Daniel (da Ponte Plural) foi franco com as bandas: “Ou adiamos sem garantias, ou corremos para fazer valer, ou cancelamos de vez”. Para a cena, não há chance de prejuízo que não faça correr atrás de qualquer objetivo.

Kapitu no Grito Rock Niterói (foto pelo twitter da banda)

Daí para frente foi uma corrida contra o tempo: Arrumar o som, comprar as bebidas, estocar as latinhas, fazer a passagem de som, divulgar o novo lugar, arrumar uns cds e algum som para tocar no primeiro andar da festa e outras coisas. Tudo feito pelas bandas, como um belo coletivo faz, pensando em todos. O resultado disso, desse esforço comum para fazer ocorrer, foi ver a casa cheia, com gente do lado de fora. Na última banda, o Holger, a cerveja já tinha acabado, praticamente abatendo um possível prejuízo da produção.

O Holger, alias, deu um show de irreverência e encerrou a noite com uma jam improvisada aos pedidos de Cassius Augusto, do Dorgas – o mesmo que constantemente entrava no palco e cantava as músicas como se já fosse um integrante do Holger. Quem abriu a noite foi o pessoal da Bow Bow Cogumelo.  Com batidas contagiantes, misturando estilos e ritmos, lotaram o palco com instrumentistas, vocalistas e participações – incluindo um belo cover de “Stab”, Planet Hemp. A banda é de Niterói, terra do evento, assim como a The Fraktal, talvez a maior surpresa da noite. A banda já entrou no palco deixando bem claro o quanto é difícil fazer um repertório próprio e mostrou sua mistura inteligente de industrial com orquestrações e batida eletrônica. Ainda falta impostação da voz do vocalista e a eles experiência para falar com o público (o vocalista e o baixista se atropelavam nas palavras e acabavam atrasando o show) – mas não dá para não notar o curioso e estiloso fato de todos tocarem descalços.

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Colombia Coffee tocando Bons Garotos e Cine Ideal

Outras que fizeram um show memorável foram a Colombia Coffee e a Tipo Uísque. Explosivos como sempre, a Colombia brigou contra o click (marcador de tempo) que estava no ouvido do baterista Dennis, mas nem por isso deixou de fazer um show memorável, intimista e potente como o som da banda pede. Só não foram mais ovacionados que o Tipo Uísque, que já tinha até público próprio cantando suas músicas e fez um show praticamente impecável. Na hora que o pé do surdo da bateria quebrou no meio de uma música, prontamente Rodrigo do The Fraktal se disponibilizou a segurar o instrumento até o fim do show, ainda faltando 3 músicas – e você aí reclamando que as bandas não se ajudam. O mais interessante foi a cooperação de cada integrante para o outro: um ajudava o outro a montar seus intrumentos, seja a estante de pratos de Larissa, ajudada por quase todos; os pedais das guitarras, ajudado pela baixista Joana; o teclado de Aline ajudada por Gabriel… e por aí vai. Nenhuma banda anda sem cooperação mútua, interna ou externa, como a noite nos mostrou.

Na noite anterior foi a mesma coisa. O pessoal da banda Tereza estava no Grito Rock Niterói e, por exemplo, o pessoal da Tipo Uísque estava no Circo Voador. Não só eles como o pessoal do Clã da Pá Virada, quem nem estava no festival, entre outras bandas. Inclusive os produtores que teoricamente seriam concorrentes da Ponte Plural estavam ajudando a ‘fazer acontecer’ e da sua forma fortalecendo a cena. O pessoal da Grande Roubada montou até uma banquinha de Lista Amiga para ajuda a encher a casa. Enquanto, eu e outros blogueiros e jornalistas estavamos lá na linha de frente fazendo o nosso trabalho: divulgar a movimentação da cena independente no Rio.

Mídia, bandas, produtores e casas de show andando juntos. Isso é a definição de um coletivo e a prova que ainda ainda existe uma cena viva e com novos filhos para mostrar. O Medulla escolheu gravar seu novo clipe no palco do Circo e foi recompensado com um público realmente interessado. Keops, um dos irmãos vocalista, estava lá, de gesso na perna após um acidente de moto que quase mandou seu tornozelo para a mesa de cirurgia. Mas o cara estava lá, e gravando clipe. Ficou até o final do evento com a mesma garra de quem estava ali em pé a horas vendo banda após banda. Fui perguntar a ele sobre os porquês disso e em resposta recebi um discurso de apoio a cena, de união e fortificação, vindo de alguém que já tem um cd por uma gravadora e hits emplacados na MTV. Se ele se importa tanto com isso, quem é você para estar aí, de braços cruzados?

De certo houve um erro de cálculo da produção. Eram 6 bandas, mas ainda adicionaram uma 7º faltando uma semana para o evento, que ocorreria num quinta-feira. Além disso, cada banda era muito diferente da outra, atraindo fãs de estilos específicos e esvaziando os outros. A área em torno do Circo encheu mas nenhuma banda levou o público inteiro para baixo da lona voadora. O Tereza talvez tenha se dado melhor nessa: muitos amigos da PUC, local onde a banda nasceu e frequenta, foram lá só para vê-los, o que fez o show dos niteroienses explodir. Músicas novas, clipe novo, single novo e muita diversão. Houve quem saísse de lá reclamando que não tocaram tal música, o que para uma banda com nem um disco cheio lançado ou tenha dois anos de estrada, é incrível.

Talvez fosse no Emicida que aconteceu o desacordo da noite. Quando o rapper paulista entrou no palco, seus manos foram pela primeira vez para baixo da lona e saíram de lá decepcionados pelo fato dele ter tocado apenas partes de várias músicas, por ter ficado de 30 a 40 minutos arrumando o palco, câmeras e tudo e só tocado por cerca de 25 minutos. A participação do Macaco Bong foi apagada e muitas vezes parecia até desnecessária, já o dj que acompanha o Emicida soltava as bases completas, já com bateria, baixo e guitarra e os músicos acompanhavam apenas, sem muita improvisação. Em campo solo, o Macaco Bong fez um costumeiro belo show, mostrando inclusive ótimas músicas novas, mas para um público cansado e reduzido, com menos de 30 pessoas que se arrastaram para casa às 4:30 da manhã aos fim do último acorde.

Com advento do corte no set de Emicida, o Vivendo do Ócio (que tocou antes) ganhou um tempo maior no palco e fez um show no mais alto grau do rock n’ roll, arrancando até gritinhos da platéia. A extensão da apresentação cansou alguns queixosos da semelhança no som do quarteto baiano com outras bandas e ainda dizendo que teriam músicas muito parecidas. Quem merecia um tempo maior foi o Holger, que, apesar dos erros de ritmos entre percussão e bateria, estavam empolgadíssimos em cima do palco do Circo. Durante o show, chamaram várias vezes seus amigos do Dorgas, que estavam voltando de um ensaio. Na última música, quando Tchello e Pata finalmente os avistaram na platéia, a baderna começou. O quarteto carioca invadiu o show dos paulistas bem na hora do funk, pegaram os instrumentos e fizeram o que melhor sabem fazer: celebrar a música e amizade.

E é essa a síntese do que se deve ter quando o assunto é cena: priorizar a música e a amizade. Enquanto você fica reclamando que não existe mais cena e tudo está morto, passe a olhar quantas novidades subiram em palcos cariocas nos últimos meses e você perdeu. Procure saber quem são as produtoras, as bandas mais ligadas, as mídias e casas que ocorrem os evento. Se você não fizer nada e não tomar esses fatos como exemplo, vai continuar no canto reclamando sem razão. Participe e faça renascer a p*** da chama que você deixou diminuir, c******.

Que a carapuça sirva para quem quiser ler.

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Daniel e Lua, vocês estão de parabéns pelas intenções, pela força e moral que vocês dão a todos que fazem parte da cena, e isso não inclui só bandas, como vocês já bem devem saber. Parabéns pela luta e garra. Ponte Plural salvando guitarras!