Festival Vaca Amarela contempla Goiânia com carisma e bons shows
Após dois anos fechado, o Centro Cultural Martim Cererê reabria seus portões para a cultura goiana. Acontecia ali, em três dias, o Festival Vaca Amarela que trazia nomes locais e nacionais para apresentações em um clima de descontração e amizade, ou como dizem os goianos, um clima“bom demais”.
Quem olhava a programação tinha a clara impressão de que a curadoria do evento confiava não só em bandas de outros estados, mas tinha consciência do refinamento e qualidade de suas atrações locais, explorando bem a sua grade de horários, dando a prioridade certa para cada um.
Um exemplo dessa confiança é o que acontece com o grupo Luziluzia – liderado por Raphael Vaz, baixista também da banda Boogarins – que se apresentava em seu quarto show desde que a banda foi criada. Por volta das 20h30 eles mostravam canções melancólicas discorridas em bons riffs e batidas. “Longe não mais”, “Monólogo do Velho Louco” e “Summertimes” faziam o público esquentar na primeira noite.
Na sequência, às 21h, quem se apresentava no palco ao lado era os metade sergipanos e metade paulistanos, Bicicletas de Atalaia, banda que lançou seu disco homônimo recentemente. O grupo parecia se expandir em palco. Com muita vontade, novas versões de canções como “Diga-lhe que mando a meia”, “O Verão e o Absurdo” e “O Menino e o Anzol” os rapazes se afirmaram e angariaram fãs com um rock-vintage com uma pegada Bossa Nova.
Naquele mesmo palco um pouco mais tardar, quem se apresentava era a cantora Dizzy Queen (ES) junto do grupo local Overfuzz, mostrando o que queriam. Ali, víamos garra nas guitarras e pegada na bateria e isso mostrava que o show deles, que ocorreria no dia seguinte, poderia ser arrasador.
Na sequência, o rock setentista voltou. Após o LuziLuzia , agora o grupo Ultravespa mostrava que sabia fazer um chiclete dançante grudar a cada canção tocada, “Motel Barato”, “Deixe meu inferno e volte para o seu” e “Acesso” foram as que incendiavam o público no palco Pygua.
Entretanto, o nome da noite, antes dos headliners era mesmo o Cambriana. A banda local dona do hit “The Sad Facts” parecia ser o Arcade Fire goiano. Todos estavam ali, agarrados na grade para ouvir os versos românticos e assertivos do grupo, que segurou o público até o último segundo com sorrisos e empolgação nas canções do seu disco “House Of tolerance”.
Os paranaenses do Nevilton e do Bonde do Rolê tinham a missão de fechar aquela noite, e justamente por não compartilharem do mesmo público, é que um show começou em cima do outro. O Nevilton fazia seu rock virtuosso no palco Pygua e mostrava canções como “Sacode”, “Vou ver o Amor” e “Porcelana” conquistando os apreciadores do bom rock’n’roll.
Enquanto isso, no outro ao lado, as luzes vermelhas se acendiam para receber Rodrigo Gorky, Laura Taylor e Pedro D’Eyrot. O Bonde do Role se sentia em casa, e criava um verdadeiro altar, com cruzes que piscavam, papel higiênico, chantili e dezena de infláveis. Era o verdadeiro caos que contagiava o público que não cansou nem por um minuto.
A potência do Bonde parecia destruidora, e era realmente esse o intuito deles: derrubar tudo. Com batidas rápidas e fortes de músicas como “Kilo”, “Picolé”, “Solta o Frango” e “James Bonde” eles colocavam tequila na boca do público como se fosse água.
Já na sexta-feira, devido ao feriado, o Centro Cultural lotara mais rapidamente que o dia anterior e assim, o que já estava quente por natureza, esquentaria ainda mais com o show da DRY, a primeira banda a se destacar naquele dia.
Com muitas surpresas e promessas, o dia 15 ainda teria a apresentação de grupos como o Porcas Borboletas (MG), que mostrava o seu experimentalismo em palco com canções como “Todo mundo tá pensando em sexo”, “Tudo que eu tentei falhou” e “Aninha” eles não perdiam a atenção do público. E a loucura dos Boogarins com sua lisergia juvenil.
O grupo goiano era a promessa daquela noite e quando entrou em palco exibiu um pouco do seu doce e interiorano rock psicodélico. A definição mais pontual para a apresentação seria dizer que aconteceu o encontro d’Os Mutantes com os rapazes do Tame Impala no centro de Goiás.
“Lucifernadis”, “Erre” e “Hoje Aprendi de Verdade” estavam nas pontas das línguas dos presentes, que contagiados pela vibração queriam que que o show durasse muito mais do que os trinta minutos que cada banda tinha para tocar.
O Overfuzz, que já tinha se destacado no dia anterior, explodia no palco ao lado na data da proclamação das república. Por volta da meia-noite eles faziam uma apresentação que colocava respeito, riffs rápidos, uma bateria insana e um baixista mais do que virtuoso.
Por fim, a noite ficou por conta do inacessível Projota, que lotava o palco Ygua e mostrava que não apenas de rock’n’roll a cena de goiana sobrevivia, com um rap sem enrolação, o paulistano levantava um público grande, e assim ele finaliva aquela noite do segundo dia.
No sábado, o clima já era de encerramento, apesar de 16 bandas ainda tocarem naquele dia – prestigiando o hardcore local e nacional – o sentimento já era de despedida e saudosismo.
Os principais nomes locais dessa cena, como Vero HC, A última Theoria e Kamura, abririam os trabalhos para o show do headliner Dead Fish. Mas Goiânia apostava também em Cherry Devil e Hellbenders naquela noite e estavam sempre na boca do público e dos organizadores “Você vai assistir ao show do Cherry Devil e do Hellbenders?”, a aposta foi correta.
Ambos os shows não desentoaram da proposta mais hardcore do último dia, e levantava o público para pular e bater cabelo. O show do Hellbenders era regado a pinga e muita agressividade, a cobra estampada no painel de led ao fundo, mostrava o espírito que aquilo tinha que ter: sorrateiro e agressivo.
Por fim, o Dead Fish colocou suas canções rápidas e ideológicas para fechar os três dias de festival e explicou que ali rolava mais do que música, era a ideologia de cada um na plateia que esperava por eles e que fazia com que o Hardcore fosse um movimento resistente.
Antes de apagar as luzes, Daniel Belleza agarrou a guitarra e foi ao palco cantar Roberto Carlos e Ramones encerrando a décima segunda edição do Festival Vaca Amarela de maneira familiar, como quem se sentia em casa. Sentimento esse, que estava em todos que participaram daquele feriado que se passou no cerrado.