Não muito tempo após a estreia solo de um de seus integrantes, a banda mineira A Fase Rosa demonstra que tem talento e criatividade de sobra e apresenta “Leveza”, que retrata o momento dos integrantes e sua relação com a música. O momento, de acordo com Thales Silva, era de relaxamento e naturalidade com as composições e arranjos. “Para se ter uma idéia da vibe que rolava, ela é uma canção que fala sobre a sensação causada pela experiencia de enxergar e experimentar o mundo sob a audição do disco de João Gilberto, 1973.”, comenta ele sobre e a faixa-título.
A inspiração para o disco surgiu de diversos lugares. Entre audições recreativas e papos sobre referências, foram muitos os nomes que influenciaram a construção do trabalho. “Somos vários e com diversas influências. Batemos muito papo sobre referências para esse disco. Trouxemos para as audições Bob Marley, Itamar Assumpção, Tom Zé, Calypso, Timbalada, Vampire Weekend, Bon Iver e toda turma da música independente atual.”, diz Thales. “Do ponto de vista compositor eu não largo de Gilberto Gil, Caetano Veloso, Djavan, Leo Minax e Jards Macalé.”
De acordo com o artista, a produção foi intensa e muito focada em sintetizar todas as referências e ele comemora dizendo que crê que a banda atingiu o resultado. Agora, ele conta um pouco sobre cada faixa de “Leveza”.
Confira:
Mãos Unidas (Thales Silva)
Essa música foi composta como exaltação a brasilidade e a capacidade que temos de prosperar apesar da derrota histórica que sofremos desde o descobrimento. Me inspirei nas últimas palavras de Darcy Ribeiro, no livro O povo brasileiro. Musicalmente apostamos no que compreendemos ser o nosso melhor. A experimentação e a reconstrução dos mais tradicionais ritmos brasileiros com roupagem atual e energia mais rockeira.
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A Praia (Thales Silva)
É o nosso primeiro single. É uma espécie de pagode baiano que demos roupagem diferente também. Usamos ritmos latinos misturados com ijexás e outras baianidades nagô para montar a música. O Rafael e o Boi deram o ar sofisticado através de timbres e arranjos mais do indie rock do que qualquer outra coisa.
A letra é também uma exaltação ao movimento “Praia da estação” que existe em BH, já a alguns anos. O movimento é livre, horizontal e surgiu como vontade de poder sobre nosso espaço. Ganhou força como resposta o prefeito de Belo Horizonte e sua administração fria e contra a alegria na experimentação da cidade. O refrão desafia o prefeito,hehe.
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Leveza (Thales Silva)
Essa música sintetiza um pouco a sensação que pairava no momento que compunha muitas das músicas do disco e consequentemente no momento que produzíamos ele. Existe hoje uma naturalidade e ausência de peso no momento de produzirmos nossas coisas. A banda está entrosada e muito ciente do que busca nesse momento. Os arranjos são simples e fluem com naturalidade.
Na letra trato do disco 1973 de João Gilberto e a sensação de experimentar o mundo, a cidade e o cotidiano sob sua audição.
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Treasures and Tragedies (Thales Silva)
É uma canção de amor. Faço brincadeiras com as palavras e não sei porque senti naturalmente guiado a escreve-la em inglês. Talvez pelo clima que me remete à canção tradicional americana. Aquelas cantadas pelo Nat King Cole. Enfim, saiu assim. No refrão, quando eu pensei no colo desse amor eu não poderia traduzir isso pro português. Deixei assim.
Na banda nós apostamos nesse reggae em 3. Falamos muito em Bob Marley pra fazê-lo, é claro. Convidamos a Patrícia Rezende do Dead Lovers pela sua voz que tem uma doçura e leveza especial para marcar a música e o disco. Chamamos também pela amizade e carinho, pois já tinha um tempo que era pra essa parceria acontecer.
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Paraíba (Thales Silva e Rafael José)
Paraíba é uma música do Rafael com letra minha. Quando ele trouxe eu gostei muito e a banda pirou. Prometi uma letra e fiz. Pensei nos bailes de forró mais autênticos. Pensei no calor climático, mas especialmente no calor humano que esses ambientes proporcionam. Pensei na lascividade da dança dos corpos e fiz uma brincadeira com duas letras de cunho machista, invertendo seu sentido. Reflexo de bons papos com amigas feministas que vem nos ensinando cada vez mais a compreender e respeitar o universo das moças.
Apostamos firmes nesses bailões, nas aparelhagens. Carimbó, sarrabulagi do chimbinha e todo tipo de malandragem rítmica aí dentro.
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BH-SP (Thales Silva)
Outra canção de amor desse trabalho. Essa fala do vai e vem entre BH e Sampa, para que esse momento acontecesse.
Na produção demos uma energia especial para essa canção que é muito bossa, mpb tradicional. Guitarras com timbres ousados, baixo certeiro e o ritmo reconstruído. Pensamos muito em Tom Zé.
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Guanabara (Thales Silva)
Fomos muito ao Rio nos últimos anos e acabamos fazendo grandes amizades. Isso nos possibilitou uma experimentação diferente da turística. Sempre achei o Rio algo à parte. Tanto pelo lado bom, quanto pelas misérias. Fiz a letra pensando nisso. Lembrei de Darcy Ribeiro de novo. E mais do que o Brasil, é o Rio a tal nova Roma de que ele fala no livro sobre nosso povo. A mística da cidade, a riqueza x pobreza, a beleza dos corpos das pessoas, a miséria e a magreza de outros.
Na produção trabalhamos a pegada afro, meio samba, meio axé, meio novos baianos. Honestamente não sei dizer com precisão. É o lance da naturalidade de sentar e tocar a música como ela vai saindo. Os timbres me agradam muito. Pensamos nos antigos discos da Gal.
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Essa Nega me falta (Thales Silva e Paula Berbert)
Parceria com a querida Paula. Dividimos a letra e nas nossas conversas a Paulinha me foi falando das suas memórias, dos quintais de sua infância em Uberlândia. Da voz das pessoas queridas chamando, da sua sensação de pisar a terra.
Musicalmente foi uma nova aposta na reciclagem e renovação de ritmos tradicionais. Demos nova leitura ao maracatu, com um violão meio samba, meio rockeiro. No refrão aquela vontade boa de dançar devagar.
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Florzinha (Thales Silva)
Essa música trata sobre o início de um amor. Sobre a dúvida do que é aquilo. “se não for amor. Que dure o tempo necessário para parecer…”. Essa sensação reflete muito minha relação com a palavra e a sensação.
Experimentamos novamente a reciclagem do samba. Brincadeiras com o ritmo e inversão de funções de instrumentos. O baixo é mais indie, mais protagonista e a guitarra traz a textura 2014, o lado que atualiza o som.
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Cheiro bom (Homenagem ao Tibet) (Thales Silva e Paula Berbert)
Eu adoro esses textos da Paula. Na verdade a letra da música são dois textos dela que eu entendi que se comunicavam. São bem pessoais e tratam das sensações dela ao experimentar o cotidiano. Pegando o ônibus de manhã para o trabalho. O asseio das pessoas e a relação filosófica da Paula com essa experimentação. Por isso compus a música nesse modo menos cantado e mais jogada. Fui encaixando as palavra ora naturalmente ora quase como um rap.
Apostamos em algo como o rock hippie brasileiro. Acho que a própria composição já sugeria aquela sensação de caos dos discos do Jards Macalé, algo de novos baianos também. Muita guitarra, violão sujo e bateria super fluente.
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Vadiar (Thales Silva)
Eu estava conversando com um amigo que desabafava sobre seu relacionamento. A sua companheira acabara de lhe pedir um tempo, pois precisava experimentar algo diferente. Novo, depois de tantos anos juntos e meio que se sentindo sem rumo. Me parece algo que ocorre a muitos casais antes de voltarem com tudo pra dentro deles mesmos. Achei muito maduro o modo como esse amigo encarou o fato. Ficou triste, é óbvio, mas entendeu que se fosse isso, que assim seria. Que ela curtisse o momento dela e que depois ele veria o que poderia ser dos dois.
Fiz esse samba rapidinho e esguio. A melodia com que eu brincava me remeteu na hora ao João Bosco e tudo casou. Chamamos o Dudu Nicácio pois acreditamos que ele poderia dar a interpretação correta a música. O Dudu é do universo do samba, sabe malandragem e canta isso como poucos.
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Coisa Preta (Thales Silva)
Essa música nasceu como uma tentativa de compor um funk carioca. Mas sempre que eu termino essas tentativas fico um pouco constrangido. Parece que estou me apropriando de um universo que não é meu. E desisti. De qualquer modo a banda apostou num caminho diferente e experimental. A vibe é reggae mas o que é tocado não poderia ser definido assim. No refrão eu sei que é rock,rs.
A letra é uma sacanagem com a frase as vezes utilizada de modo preconceituoso que é “a coisa ficou preta”. Decidi sacanear a frase e usa-la no sentido da exaltação a tanta coisa que ficou preta e foda no mundo. Falo de tudo que é preto e que eu gosto na música. Há referência a Jorge bem, Nina Simone, ao líder Martin Luther, ao próprio funk carioca. Enfim. Era pra ser um funk exaltação e virou algo típico da A Fase Rosa.
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emocionado com o relato do Thales, sobre cada música. Quem lê consegue sentir, pelo menos um tantinho, da sensação de estar imerso na "leveza". só A fase rosa tem esse poder de nos envolver. esse disco é bom d+!
Muito bom!