foto por Eduardo Magalhães | Partybusters
Imagine o que é ouvir uma pessoa muito querida (e que raramente valoriza algo nacional) dizendo que você precisa ouvir o disco de um certo artista chamado Cícero. As insistências diárias acabaram sendo o suficiente para que, depois de uma longa viagem de nove horas, eu finalmente fosse apresentado ao som da banda sensação do momento. Os leitores do Rock in Press já estão cansados de ouvir falar da banda, que realmente comove o público de uma forma que há muito tempo não acontecia nos palcos brasileiros.
O Teatro Odisseia, uma das casas alternativas da cidade maravilhosa, é realmente um lugar interessante, apesar do calor absurdo. Talvez a proximidade com a Lapa tenha um efeito mais alucinógeno no público, que acaba entrando com força nas ideias oferecidas pelas bandas. Quem se deu bem ao aproveitar a situação foi a banda Mohandas, que com uma ousada versão de “Lotus Flower”, do Radiohead, abriu a noite. Uma feliz surpresa descobrir que a canção da banda de Thom Yorke estaria bem representada se virasse um desses clássicos do baião. Logo depois foi a vez de “Hombre Maquina”, versão de “The Man Machina”, do Kraftwerk. Mas o Mohandas não ficou apenas nas duas covers que abriram a apresentação, ainda que, apesar da empolgação de alguns integrantes, o show não tenha tido outros momentos tão brilhantes – exceto na cativante faixa homônima “Mohandas”.
foto por Eduardo Magalhães | Partybusters
Seus instrumentistas variam entre diversos instrumentos, o que acaba deixando de ser um elemento diferente e atrativo, visto que a maioria das bandas independentes anda apostando na versatilidade de seus membros, mas essa multiplicidade dos membros da banda não é nem de longe um ponto negativo. As músicas autorais são criativas, com direito a belos arranjos de vozes, mas pelo menos na apresentação no Teatro Odisseia a impressão era que faltava algum instrumento na banda. Sem explorar muito o lado artístico da apresentação, a banda preferiu concentrar esforços nos seus instrumentos ao invés de trabalhar numa performance visualmente atrativa para o público. É quase como se eles estivessem animados, mas fossem tímidos para mostrar mais deles mesmo naquele momento. Foi uma boa apresentação de uma banda promissora, mas que ainda precisa de um pouco de vitamina para preencher todos os espaços vazios em algumas canções.
É preciso admitir que não entrei no Teatro Odisseia contaminado pela febre envolvendo o ex-vocalista da banda Alice. Os comentários positivos (além da insistência da minha amiga) poderiam acabar sendo prejudiciais no final das contas, afinal criar expectativas é sempre um perigo. Cícero subiu ao palco, sentou num banquinho e começou sua apresentação. O público se espremia na frente do palco, o que lembrou bastante a devoção com que as pessoas acompanhavam as apresentações do Los Hermanos na época pré-Ventura, quando a banda havia tentado abandonar um pouco da fama conquistada com “Anna Julia” e se afastou um pouco da mídia durante a turnê do disco O Bloco do Eu Sozinho. Curioso notar que o cantor se apresenta num clima totalmente MPB, com voz e violão e os olhos fechados para manter a concentração, enquanto a banda quebra tudo. Destaque especial para a pegada brutal do baterista.
foto por Eduardo Magalhães | Partybusters
A química do violão com a distorção é realmente surpreendente. Cícero consegue misturar suavidade com uma pegada de fazer muita banda de rock repensar suas bases. O grande momento do show não foi na hora em que bossa-nova nova de “Ensaio Sobre Ela” encantou o coração dos apaixonados, não foi quando os primeiros acordes de “Tempo de Pipa” fizeram o público sambar alucinado, ou do momento em que “Açucar e Adoçante” me levou para aquele mundo semi-insconsciente que apenas algumas músicas são capazes de nos transportar, e nem mesmo quando ele tocou qualquer outra de suas belas “canções de apartamento”, um retrato tão singelo da solidão. O barato da apresentação do Cícero foi entender os motivos que fizeram essa minha amiga, tão defensora de artistas internacionais, se apaixonar pelas dissonâncias do cantor. De olhos fechados, simplesmente sentindo a música no meio daquela sauna carioca.
Independente de ser ou não unanimidade no meio alternativo, a apresentação do cantor foi o suficiente para pensar no quanto a música brasileira ainda pode oferecer para o seu público carente. Cícero ainda tem muito para mostrar, mas com apresentações simples, objetivas e sem firulas, deixa claro que pode ir muito longe e nem precisou apelar para as barbas.
Resenha fooooooooooooooooooooda!
Sem mais.
Anotem: Esse garoto vai dar o novo rumo da MPB nos próximos anos.
Eu fui em todos os shows que ele fez no Rio e a evolução da banda no palco tá crescendo absurdamente. Não vamos perder por esperar o que vem nos próximos cds.
Só quem vai no show ver pessoalmente a qualidade e o carinho que a banda tem com as músicas e tudo.
cara, sou o VJ do mohandas e você acertou na mosca.
a banda acabou de sofrer a saída de um integrante. interessante como você sacou.
o cícero me surpreendeu, gostei bastante da apresentação dele.
abs
É por essas e outras que o diploma, o jornalismo tem de ser valorizado. Brilhante resenha!
Resenha linda!
Bacana.. Ja conhecia o Mohandas vou conhecer o Cicero agora.. 🙂