Apesar dos Pesares, Ainda Temos a Mallu


Foto por Bruno Fernandes/ Folha imagem

Mallu Magalhães aprendeu fazendo, na marra, que a carreira profissional como musicista pode ser cruel. A imaturidade demonstrada diante de jornalistas experientes e prontos para pegarem a menina em situações desconfortáveis ou a postura errônea diante das câmeras em programas de TV como “Altas Horas” e “Domingão do Faustão” foram suficientes para apresentar à Mallu o fato de que o público brasileiro é bipolar. Gosta tão rápido de uma banda quanto esquece dela – ou a repudia. A virada do mercado e seus novos modelos assustaram a produtores e empresários desprevenidos, especialmente àquele público que prefere que seu artista se mantenha underground a ser conhecido demais pelo grande público.

Nem nós, nem a produtora e nem a própria Mallu Magalhães estavam preparados para o boom desnorteante que sua música deu. Aquela doce voz lotava casas de pequeno e até médio porte com menininhas histéricas cantando músicas praticamente inéditas até o lançamento do primeiro álbum – que se revelou uma vazia coleção de canções gravadas quase às pressas para aproveitar todo o barulho que era feito. A partir daí, e do namoro com o hermano Marcelo Camelo, seu público se dividiu e sua popularidade caiu vertiginosamente, como uma mágica que começa a perder a graça. A chegada do segundo álbum também não solucionou muitos problemas: o disco é belo e bem produzido, mas carente de singles convincentes – ao menos explanava uma vibrante melhora na sonoridade e nas composições, visando o futuro e novos caminhos.

[youtube=http://www.youtube.com/watch?v=QzWh-iLFiRY]
“Sur Mon Coeur”

Há algum tempo, tenho notado movimentação maior em cima do nome da pequena infanta. Esse novo contato com o público se deu apenas após a sua produtora Agência de Música entender que não é simplesmente investir na imagem dela para o grande público – sem prepará-la – e esquecer de onde ela veio: o mundão da internet. O clipe de “Sur Mon Coeur”, e suas já quase 20 mil visualizações, é a prova que ainda existe aceitação do público e crítica e novos caminhos podem ser traçados. Afinal, Mallu não é mais aquela pequena guria de 15 anos que, apesar de se apresentar como cantora, não conseguia sustentar sua voz numa participação especial ou que não sabia se portar na frente de um grande apresentador.

Atualmente, essa ‘reconquista’ de público tem tido seus altos e baixos momentos. A triste participação dela no show do Móveis Coloniais de Acaju talvez tenha sido o momento em que soube-se que o caminho tinha que ser melhor planejado e não deveria colocá-la em toda a oportunidade grande que aparecia – fato que ocasionou, por exemplo, o vexame da entrevista pseudo-intelectual na Época, em Novembro de 2008. Mesma época em que a menina-moça, agora mulher, começou a namorar com Marcelo.

Somados os fatos e adicionando a desinformação da mídia em geral ao transmitir de forma tendenciosa a vitória de Mallu Magalhães junto a Lei Rouanet (onde muitos acharam que ela receberia 780 mil reais do governo para uma turnê, quando na verdade dependia de uma empresa privada que a patrocinasse e lhe desse esse dinheiro – o que nunca ocorreu) sua imagem ficou um tanto embaçada com o público e o ano de 2010 acabou-se baseando, principalmente no segundo semestre, a shows em SESCs e em casas de pequeno porte.

[youtube=http://www.youtube.com/watch?v=OyPUlT98PeI]
Música “?”, originalmente chamada “Tchubaruba”, da banda Canastra Suja, que segundo a produção de Mallu Magalhães se tratou de um plágio de uma canção de mesmo nome da cantora. (veja mais)

Mas na sua retomada, Mallu acordou e trocou de personagem. Largou a máscara de infantil e roupa de pseudo-intelectual para se vestir de uma pessoa simples, de opiniões mais diretas e focadas, abraçando a sua segunda chance nos ouvidos brasileiros. Parou de pintar seu rosto como uma menina e passou a ser destaque em revista de moda, marcando presença e grandes eventos e chamando atenção pela forma mais definida que seu corpo tomou.

A convivência com o Hermano Camelo também tem feito bem à Mallu. Passa a impressão que Camelo expandiu o universo da guria, a colocou em contato com novas influências, a apresentou à beleza complexa das composições em português e ajudou Mallu nesta fase de reestruturação, em que a jovem cantora e compositora assume sua brasilidade e aproveita para mostrar-se a outros públicos, de outros grupos, seja numa pose sensual e uma entrevista na Playboy (um mês após completar 18 anos), seja cantando Chico Buarque, Toquinho no Som Brasil ou Billie Holliday; seja participando do show da Nina Becker, ou cantando com seu namorado Marcelo Camelo; seja cantando com uma banda espanhola ou gravando Roberto Carlos para a trilha sonoro de filme.

As decisões que virão a seguir, da sua equipe de produção (Agência de Música) e das pessoas que a rodeiam e a ajudam profissionalmente (o amigo Mané, que a descobriu e a ajudou no início da carreira, voltou a trabalhar com ela recentemente) serão fundamentais para definir se Mallu Magalhães foi uma moda passageira ou veio, de vez, para ficar, se firmando como um dos nomes mais talentosos da geração recente da música brasileira.


Foto que essa semana apareceu  no Trabalho Sujo, que causou barulho por parecer ter um rosto dentro da bolsa, que na verdade são da capa do livro Dorival Caymmi, de Francisco Bosco.

Por isso, talvez não seja a hora certa de ouvirmos um Mallu Magalhães III e ver a mesma exposição forçada dos últimos anos. É hora de pensar melhor o caminho, de desenhar novas metas, de deixar Mallu descobrir a sua identidade como artista – uma vez que, até mesmo pela sua idade, ela está na fase de absorver influências e ver o que, dali, combina mais com ela –, de aproveitar que a banda já tem novos integrantes (Kadu Abecassis, guitarrista, saiu da banda e entrou Davi Bernardo, do Trio Skuba) e novo produtor (Xeco, produtor desde 2008, deixou o projeto) e tentar refazer aos poucos toda a visão que Mallu teve há anos atrás e toda a forma pela qual ela é vista por muita gente atualmente.

Se você achou que “Sur Mon Coeur” pode ser a chance de reencontro seu com o som de Mallu Magalhães, ouça “Me Leva“, “Daniel e Cecília” e tantas outras que pouco foram ouvidas e sequer foram lançadas oficialmente, mas que são belas peças de um quebra-cabeça infantil que se tornou grande o bastante para ultrapassar a internet e chegar a tantos pontos do Brasil, Canadá, Portugal e Espanha.

___________________________________________________

Texto por Marcos Xi e Ana Kamila
Colaboração: Cora de Alvarenga